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segunda-feira, 28 de abril de 2008

antítese - os cristãos e a homossexualidade

Por vezes, somos surpreendidos nas páginas do jornal O Progresso com as opiniões do bispo da Diocese de Dourados, Dom Redovino Rizzardo. Como pastor de ovelhas, ele deve e pode opinar a respeito dos assuntos que considera importantes para a manutenção do rebanho. Entretanto, em função dos últimos juízos de valores emitidos, talvez seja necessário, como em um exercício mental, refletir um pouco sobre os argumentos utilizados principalmente quando o assunto em discussão é o outro em sua mais completa definição e multiplicidade. Para tanto, antes de qualquer coisa, é necessário que se diga que a discussão proposta não evoca a hierarquia existente, sendo apenas alguns questionamentos da História para a Teologia.
Em opinião emitida em 14 de Março de 2008, intitulada os cristãos e a homossexualidade, Redovino relata que o fato de os habitantes de uma determinada ilha grega não estranharem a homossexualidade não coincide com a evolução de espécie humana. Considerei estranho, pois a igreja sempre se opôs ao evolucionismo. Depois, ele argumenta sobre a construção de valores com base na ética, na razão e na moral, todos frutos do liberalismo, mas no texto com base religiosa. Ele fala ainda da diferença anatômica entre os órgãos sexuais, e que “a realização humana acontece somente no encontro maduro, aberto e confiante com o diferente, ou seja, entre homem e mulher”.
Não concordo. Primeiro, porque falar de diferença tendo como ponto de partida a Igreja Católica não é muito convincente. A própria narrativa bíblica desconsidera o outro quando postula que Deus criou o homem a sua imagem e semelhança, ou seja, igual a ele, portanto, a diferença foi excluída dessa criação. E a diferença que ele evoca é uma diferença física, fruto do pensamento positivista em voga no mesmo século em que as idéias dele parecem residir, o XIX. Segundo, porque tendo Deus criado, homens e mulheres, significa que ele era portador dos dois elementos: masculino e feminino, sendo assim ele seria andrógino ou no mínimo, hermafrodita, mas não é a sexualidade de Deus que está em questão, e sim a dos humanos. E terceiro, porque mesmo entre pessoas do mesmo sexo o encontro maduro, aberto e confiante acontece. E anatômico por anatômico, existem outras regiões erógenas no corpo humano.
Ser cristão não depende da aceitação da palavra de Deus, mas sim da consideração da vivência de Jesus, e como sabemos, ele mesmo nunca escreveu uma só palavra, sendo suas parábolas interpretadas por seus seguidores, que por sua vez estiveram sujeitas à memória – poderosa produtora de lapsos, sem falar do critério seletivo que a mesma possui.
Encontrar o referencial a seguir é difícil para qualquer ser humano. A Igreja Católica apenas oferece o seu, mas daí considerar que o dela é o mais fácil me parece uma atitude desesperada de alguém que vê o catolicismo estagnado por causa do dogmatismo anunciado. E sobre quem deverá estabelecer as leis que norteiam o comportamento humano se não for à própria sociedade que o vivencia, com certeza a Igreja não será, haja vista que ela não consegue nem estabelecer homogeneidade dentro do clero (basta lembrar que o Papa em visita recente aos Estados Unidos foi obrigado a considerar sobre os abusos sexuais feito por padres).
As verdades absolutas não existem mais. Os grandes modelos explicativos sucumbiram e com eles as velhas estruturas dogmáticas. O que me parece possível entender disso tudo é que estamos diante de uma estreita vinculação com o que postulava Joseph Ratzinger quando era Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, que silenciou freiras e retardou a discussão ecumênica em no mínimo vinte anos.
O discurso, portanto poderia ser outro, o do amor, do entendimento e do respeito às diferenças. Sendo todos nós filhos de Deus, quero poder continuar acreditando que não existem filhos mais ou menos amados.
Sobre o comportamento homossexual em si, penso que as pessoas deveriam estar mais atentas às construções sociais. A heterossexualidade também foi um conceito construído. É engraçado verificar que o berço da civilização ocidental, a Grécia, ou seja, a mesma região que estranhou o bispo pela aceitação da diferença, esteja perdida nos livros de história e que sua importância seja resumida, ou será que podemos dizer que os gregos eram héteros sem ter medo de cometer anacronismo teórico?
Por fim, a promiscuidade não é exclusiva dos gays, tampouco a AIDS, que até onde meus amigos das ciências médicas puderam me informar, não faz entrevista para saber o melhor corpo a contaminar tampouco considera a sexualidade como critério de seleção. Além do mais, se os casais heterossexuais não fossem promíscuos não seria mais necessária à existência da Pastoral Familiar, que surge no momento em que a Igreja percebe que o modelo tradicional estava sendo desconstruído por vários motivos, dentre eles a “traição” de homens e mulheres ao sacramento do matrimônio através de relações extraconjugais, geralmente relações carnais. Se tudo no mundo se transforma, a igreja também deveria. Mas o novo causa medo, em muitos casos pode ser aterrorizante, mas sem dúvida também é excitante. Portanto, ouvir e ler é preciso, mas navegar – no sentido de experienciar, também é. E, rumo ao novo milênio com idéias fora do lugar, não dá.