Pesquisar este blog

quinta-feira, 30 de julho de 2009

CONSIDERAÇÕES SOBRE A IDENTIDADE DOURADENSE

Muito tem se investido na construção da identidade douradense (concursos literários, curtas-metragens, folders, comerciais de televisão, cerimônias oficiais). A multiculturalidade é utilizada para definir esta identidade como homogênea e horizontal. Procura-se forjar, por meio de um sentimento único de amor a terra, que diferentes culturas convivem harmoniosamente em Dourados. Ciente de que, desde o final do século XIX, o território onde a cidade está localizada abriga diferentes culturas, o que a caracteriza como multicultural, a proposta é analisar a construção da identidade douradense entre 1920 e 1990, a partir de seu mito fundador, discursos que representaram e representam e imagens que simbolizam.
O mito fundador da identidade douradense, um discurso arregimentador que evidencia qualidades do antigo Patrimônio (solo, clima, construções, predisposição ao desenvolvimento e ao progresso), surgiu na década de 1920, por meio de quatro reportagens publicadas pelo jornal O Progresso em Ponta Porã. Nos anos 1930, depois da emancipação política, o governo municipal procurou fortalecer este mito organizando a cidade com o intuito de prepará-la para um futuro de promissor: organização do espaço urbano, incentivos para abertura de novas casas comerciais, abertura de estradas para facilitar a locomoção e construção de pontes para ajudar no escoamento dos produtos foram ações que impulsionaram o progresso da cidade.
Nos anos 1940, a fundação da Colônia Agrícola Nacional de Dourados – CAND tem um significado importante, pois para incentivar a atividade agrícola, foi necessário homogeneizar o pertencimento coletivo. As memórias produzidas sobre Dourados descrevem situações multiculturais. A cidade recebeu diferentes contingentes populacionais oriundos de várias partes do país e do mundo, e por isto, assistiu em seu território os conflitos e as negociações entre esses grupos.
Multicultural, qualifica uma sociedade formada por diferentes culturas onde problemas de governabilidade surgem a partir desta formação, esses problemas exigem estratégias de regulação do múltiplo que são chamadas de multiculturalismos. A produção acadêmica pouco ou nada fala da identidade douradense. Por outro lado, com relação à história do município, apresenta um trabalho significativo, principalmente porque abre um leque de possibilidades investigativas acerca de sua história e memórias. Os pioneirismos, a luta da civilização contra a barbárie e as especificidades locais, também compõem parte da estrutura deste.
A situação fronteiriça contribuía negativamente para as representações sobre a região. Ao apresentar aspectos da fronteira e dos fronteiriços, podemos discutir sobre uma realidade de trocas físicas e simbólicas, positivas e negativas, de proximidade e de segregação. Um discurso assumido e amplamente divulgado pela imprensa por meio dos jornais O Douradense e O Progresso.
Nas reportagens publicadas por eles encontram-se mitos fundadores, discursos identitários, campanhas pró progresso e civilização, ampla política de valorização da cidade, do solo, do clima, das possibilidades para o futuro e de suas gentes. Foi por meio das páginas dos jornais que circularam e circulam até hoje em Dourados, como é o caso do O Progresso, que cidadãos letrados, jornalistas e advogados valorizaram a agricultura, criticaram a Mate Laranjeira, defenderam a industrialização dos ervais, incentivaram a pecuária refinada, selecionaram os amigos da cidade, reivindicaram melhorias para o município e elegeram políticos nos níveis, estadual e federal.
Nessa produção de sentidos realizada pela imprensa, porém, pouco falou sobre as populações indígenas aqui existentes. Muito pelo contrário, procuraram escondê-las. A década de 1950 assistiu a continuidade desse projeto. Nos anos 1960 veia a primeira oficialização, a da História, por meio da monografia de Ercília Pompeu. Dez anos depois, em 1970, bandeira, brasão e hino passaram a compor o conjunto de representações simbólicas douradense.
Na década de 1980 discursos emergentes rompem o silêncio e passam a solicitar seu reconhecimento público, ou seja, a demarcação clara das diferenças. No início dos anos 1990, a manipulação do imaginário coletivo se dá por meio da fixação de monumentos que homenageiam personagens considerados importantes para o município. No final desta mesma década, a vinculação com a fauna e a flora pantaneira foi questionada pela população, demonstrando que discursos unificadores não faziam mais sentido. Ao longo das semanas, retomaremos a discussão, década por década. Aguardem!